Quem devia estar apavorado com a ascensão de Bolsonaro é a esquerda. Ou as esquerdas, para sermos mais precisos. Mas, não. Quem está se pelando de medo são as “zelites”, aquela parte da mídia que acreditava que, derrubando Dilma Rousseff, estariam abertas as vias de acesso ao poder para o PSDB.
O conservadorismo elitista ama o PSDB. Ali está uma gente que sabe segurar um garfo à mesa. O PSDB conta com um time de intelectuais de primeira ordem. E mesmo seus líderes são cavalheiros distinttos que falam bem, vestem-se bem, falam línguas estrangeiras. Gente fina é outra coisa.
Mas aí, a massa conservadora, a classe média batedora de panela, a juventude coxinha, os mebelistas da vida e outros que tais, consagraram Jair Bolsonaro o seu candidato à presidência. Bolsonaro é o Lula lá deles.
O ex-capitão de artilharia, ex-terrorista e ex-agitador de quartéis, é um homem sem modos. Ele não argumenta: achincalha seus adversários. Não tem posições doutrinárias, apenas opiniões idiossincráticas. É absolutamente inculto, talvez até mais do que Tiririca. É o homem dos pontos de vista extravagantes. É dos tais que acha que tudo se resolve à base de porrada.
Pois é este o homem que a classe média paneleira adora. A classe média que é superpatriota, mas visceralmente antinacionalista – adoraria ver o Brasil colonizado pelos EUA – vê em Bolsonaro o homem providencial. Ele, machão e durão, vai resolver todos os problemas do País, que têm causa na depravação moral e não no conflito de interesses econômicos.
Agora a revista Istoé – também conhecida no submundo da mídia como “Quantoé” – trouxe esta semana uma capa alarmista, estampando a cara de Bolsonaro, o bicho-papão da vez. É ataque frontal. Apela ao medo, como Regina Duarte dizendo cretinamente que tinha medo de Lula. Não percebe que é o medo da classe média que gerou o monstro que agora se tenta abater.
Tempos atrás foi Veja que advertiu para o “perigo” Bolsonaro. Istoé apenas vai na onda, para não serlevadatalcomoaquelecamarão dorminhoco de que fala o samba.
Por que tanto medo? Bolsonaro, apesar de ser de direita e antiesquerdista visceral, não tem compromissos com as “zelites”, ou seja, não reza pela cartilha neoliberal, não tem rabo preso com banqueiro, não é recebido nos salões da burguesia paulista.
Ele já disse que entende lhufas de economia. Aí mora o perigo. Vai buscar aconselhamento entre os neoliberais, entre os vende-pátria, os entreguistas, os quinta-coluna. Até aí, isto poderia deixar a grande imprensa mais tranquila. Ocorre que a “geni” da política brasileira tem lá os seus caprichos nacionalistoides, um nacionalismo algo ingênuo e sentimental. O bicho é xucro e talvez não possa ser domado.
O medo se agiganta a partir da percepção de que Lula talvez não possa ser candidato. Lula fora do páreo, para onde iria os votos lulistas? Há quem acredite que, com Lula fora, Bolsonaro vence com um pé atrás. Ainda que boa parte do voto lulista posa ir para quem Lula recomendar, o fato é que as chances de Bolsonaro aumentam.
E o pior é que as alternativas antilulistas frequentáveis, respeitáveis, se mostraram um fiasco total. Doria é piada. Joaquim Barbosa? Este é de “mentirinha”. Luciano Hulk? Não me façam rir. Ciro Gomes? O mais preparado de todos, do ponto de vista intelectual, mas elitista demais, não vai ao povo, não consegue falar a linguagem do povo, de que Lula é mestre e na qual Bolsonaro vai ficando batuta.
Veja e Istoé foram publicações que, no afã de derrubar Dilma e envenenar o povo contra o PT, acirraram o ódio e o clima de confrontação ideológica do qual emergiu Bolsonaro. Foi para isto que deram o golpe? Não, não foi, mas deu nisso. Agora não adianta chorar as mágoas. Quem pariu Mateus que o embale.
Helvécio Cardoso, jornalista