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OPINIÃO

Breve, mas necessária, explanação sobre o servidor público

Num do­min­go à noi­te re­cen­te, o Fan­tás­ti­co, na Re­de Glo­bo, exi­biu uma co­mo­ven­te ma­té­ria so­bre a his­tó­ria dos bai­la­ri­nos do Te­a­tro Mu­ni­ci­pal do Rio de Ja­nei­ro, com des­ta­que pa­ra a pri­mei­ra bai­la­ri­na, Clau­dia Mo­ta, jo­vem ta­len­to­sa e ex­tre­ma­men­te pro­fis­si­o­nal, que há 10 anos se de­di­ca ao ofí­cio. Ela se re­cu­sa a pa­rar de dan­çar, ape­sar de o Es­ta­do não pa­gar o seu sa­lá­rio há dois mes­es.

O dra­ma de Clau­dia é o de to­dos os mais de 500 fun­cio­ná­rios do te­a­tro. Eles po­de­ri­am fi­car em su­as ca­sas e o te­a­tro fe­cha­ria as por­tas, mas as apre­sen­ta­ções con­ti­nuam (lo­ta­das, va­le di­zer). Não são to­dos que con­se­guem par­ti­ci­par por­que sem sa­lá­ri­os é di­fí­cil pa­gar pe­la lo­co­mo­ção até o lo­cal, mas a mai­o­ria se­gue tra­ba­lhan­do.

Há quem di­ga que os fun­cio­ná­rios pú­bli­cos são pre­gui­ço­sos, mas es­sa tur­ma é um exem­plo de que is­so não é ver­da­de. Es­sa ge­ne­ra­li­za­ção é mui­to in­jus­ta e pre­ju­di­ca a ima­gem dos bons pro­fis­si­o­nais que tra­ba­lham no se­tor pú­bli­co, mui­to de­les em área es­sen­ci­ais pa­ra a ma­nu­ten­ção da vi­da, co­mo a sa­ú­de e a edu­ca­ção.

O Rio de Ja­nei­ro es­tá mer­gu­lha­do em dí­vi­das, mo­ti­vo pe­lo qual os sa­lá­ri­os não es­tão sen­do pa­gos. Mais de 170 mil ser­vi­do­res não re­ce­bem seus ven­ci­men­tos des­de abril. É uma si­tu­a­ção ver­go­nho­sa, re­sul­ta­do de anos de pés­si­ma ges­tão, da re­ces­são eco­nô­mi­ca, dos pro­ble­mas na in­dús­tria do pe­tró­leo, da que­da da ar­re­ca­da­ção e, co­mo era de se es­pe­rar, da cor­rup­ção en­vol­ven­do o ex-go­ver­na­dor Sér­gio Ca­bral, ex-se­cre­tá­rios e cin­co con­se­lhei­ros do Tri­bu­nal de Con­tas. To­dos es­tão pre­sos.

É im­por­tan­te res­sal­tar a cor­rup­ção e a má ges­tão por­que são fa­to­res que in­flu­en­ciam for­te­men­te a qua­li­da­de dos ser­vi­ços pú­bli­cos pres­ta­dos. In­fe­liz­men­te, nes­sa ‘no­ve­la’ já an­ti­ga, as ví­ti­mas são tra­ta­das co­mo vi­lãs. O fun­cio­ná­rio pú­bli­co, aque­le que es­tá na pon­ta e faz o con­ta­to di­re­to com a po­pu­la­ção, é sem­pre o mais cri­ti­ca­do. É sem­pre ele que pre­ci­sa li­dar com as re­cla­ma­ções. É aque­le que tem a ima­gem man­cha­da.

A cul­pa não é do ser­vi­dor quan­do, por exem­plo, fal­tam me­di­ca­men­tos em hos­pi­tais pú­bli­cos. Ele, na ver­da­de, faz o que po­de com o pou­co que tem em mãos pa­ra não dei­xar à mín­gua os do­en­tes que che­gam di­a­ria­men­te.

As­sim tam­bém são os pro­fes­so­res. Além de mui­tos ca­sos de fal­ta de res­pei­to dos alu­nos, eles pre­ci­sam tra­ba­lhar em es­co­las sem car­tei­ras, ca­dei­ras, ma­te­ri­ais di­dá­ti­cos, la­bo­ra­tó­rios, en­tre ou­tros di­ver­sos itens es­sen­ci­ais pa­ra as au­las. Em al­gu­mas ci­da­des do in­te­ri­or, as sa­las de au­la se­quer têm in­fra­es­tru­tu­ra. Não sur­pre­en­de que mui­tos pro­fes­so­res sin­tam-se des­mo­ti­va­dos (quan­tos não são os ca­sos que pro­cu­ram aju­da mé­di­ca?). Is­so se re­fle­te na au­la e ge­ra crí­ti­cas de alu­nos e pa­is. Cri­ti­cam o do­cen­te, mas de­ve­ri­am di­re­cio­nar su­as crí­ti­cas – jus­tas, é cla­ro – ao po­der pú­bli­co.

O que mui­tos não per­ce­bem é que es­sa é ape­nas a pon­ta do ice­berg. O pro­ble­ma es­tá na má ges­tão e na rou­ba­lhei­ra. Quan­do o re­mé­dio não che­ga ao pos­to de sa­ú­de é por­que hou­ve des­vi­os. Quan­do fal­ta me­ren­da é por­que al­guém rou­bou a ver­ba. Quan­do o Bra­sil fi­ca en­tre os pi­o­res em ní­veis de edu­ca­ção no mun­do é por­que os bi­lhões des­ti­na­dos ao en­si­no fo­ram mal ad­mi­nis­tra­dos. Mas, ape­sar dis­so tu­do, o se­tor pú­bli­co car­re­ga a cruz que não é de­le. É a ge­ne­ra­li­za­ção do ‘tu­do que é pú­bli­co é ru­im’.

Co­mo em to­das as clas­se, há ca­sos de mal ser­vi­do­res. Além dis­so, há pes­so­as que bus­cam no se­tor pú­bli­co uma vi­da tran­qui­la (que é uma ilu­são), quan­do o ob­je­ti­vo de­ve­ria ser con­tri­bu­ir pa­ra a so­ci­e­da­de com o re­sul­ta­do do seu tra­ba­lho. Não de­fen­de­mos que al­guns pro­fis­si­o­nais re­ce­bam sa­lá­ri­os aci­ma do te­to. É uma mi­no­ria que aca­ba ser­vin­do de re­fe­rên­cia pa­ra a po­pu­la­ção. Por cau­sa de­les, mui­tos acre­di­tam que to­do ser­vi­dor pú­bli­co é um tio Pa­ti­nhas que na­da em di­nhei­ro. Acre­di­tem: es­sa não é a re­a­li­da­de da ca­te­go­ria. Con­cor­do que al­guns ser­vi­do­res pre­ci­sam ser mais con­sci­en­tes po­li­ti­ca­men­te e co­brem das au­to­ri­da­des me­lho­res con­di­ções de tra­ba­lho, sem­pre que ne­ces­sá­rio. Por­tan­to, há crí­ti­cas me­re­ci­das.

Po­rém, in­co­mo­da ver co­mo al­guns se­to­res de­mo­ni­zam o se­tor pú­bli­co. Di­zem que até mes­mo o su­pos­to rom­bo nas con­tas da Pre­vi­dên­cia é cul­pa dos ser­vi­do­res, co­mo se eles não con­tri­bu­ís­sem men­sal­men­te com 11% dos seus sa­lá­ri­os.

Os ser­vi­do­res pú­bli­cos não são es­pe­ci­ais. Eles não que­rem ser co­lo­ca­dos em pe­des­tais. Eles pe­dem ape­nas que a po­pu­la­ção dê o de­vi­do va­lor ao tra­ba­lho que a mai­o­ria faz com cor­re­ção e com­pro­me­ti­men­to. As­sim co­mo os bai­la­ri­nos do Rio, há mui­tos pro­fis­si­o­nais Bra­sil afo­ra ca­pa­zes e de­di­ca­dos, ape­sar de to­dos os ob­stá­cu­los im­pos­tos pe­los nos­sos go­ver­nan­tes.

(An­to­nio Tuc­cí­lio, pre­si­den­te da Con­fe­de­ra­ção Na­ci­o­nal dos Ser­vi­do­res Pú­bli­cos (CNSP))

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