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OPINIÃO

O futuro no tempo

Na década de 1950, li pela primeira vez “1984”, de George Orwell. Muitos anos passados persistem em minhas lembranças a originalidade do enredo e a singularidade das ideias e expressões cunhadas pelo autor. Que viriam a ser incorporadas à linguagem de intelectuais, jornalistas estudiosos e críticos, em geral.

Dentre outras: além de Big Brother – o Grande Irmão - a “novilíngua” e o “duplipensar”. Ou seja: a mudança de sentido das palavras que, no limite, passam a dizer exatamente o oposto do seu real significado. Por exemplo: o Ministério da Paz estaria voltado para as guerras: o Ministério do Amor teria por objetivo torturar as pessoas... e assim por diante.

Não se sabe o porquê de George Orwell ter escolhido “1984” para nominar sua última obra, escrita pouco antes de morrer, vitimado pela tuberculose. Concluído o livro em 1948, o titulo seria uma inversão dessa data, quando o mundo ainda se recuperava das sequelas da Segunda Grande Guerra. Depois dos trágicos horrores do nazismo e do fascismo, afinal derrotados, tinham início os anos da Guerra Fria. É nesse momento que o escritor concebe sua metáfora-denúncia dos autoritarismos e, em espacial, do controle e manipulação de mentes e pessoas.

Certo é que o ano de 1984 chegou – e eis que passamos a viver em um mundo pós-orwelliano. De pronto, há uma apropriação do Big Brother, travestido em programa de TV que consagra tudo quanto Orwell denunciou: a vulgaridade, o exibicionismo, a imbecilidade travestida de celebridade.

De outra parte, “duplipensar” e “novilíngua” foram assimilados por comunicadores e políticos. Com efeito: o marketing eleitoral nos engabelou a todos, ao proclamar – dentre outras mentiras - as maravilhas da economia brasileira, quando nosso país caminhava firme para a maior crise da sua história. Com a agravante de que nós, contribuintes, pagamos bilhões para sermos manipulados.

De 1984 aos nossos dias, transcorreram 33 anos. Na esteira de Orwelll, gostaria de aventurar-me pelo futuro e tentar vislumbrar algo do mundo dentro de igual prazo. Ou seja: em 2050.  Até lá, não estarei mais entre os viventes; talvez seja vagamente lembrada por algum neto ou neta mais aficionado às pessoas e coisas do passado. O que, aliás, não vem ao caso.

A pergunta inicial será: dentro de 33 anos, quantos seremos nós, os humanos? De acordo com projeções da ONU, estima-se que, até lá, os terráqueos cheguem a 9 bilhões, cerca de 2 bilhões a mais do que somos hoje. O primeiro bilhão foi alcançado em 1802 e o segundo, em 1930 – portanto, com 128 anos de intervalo. Entre 1930 e 2012 (72 anos de permeio), passamos a 7 bilhões – e seremos 8 bilhões em 2028.

Dois terços desse total vivem em países subdesenvolvidos – inclusive no Brasil - e subsistem com menos de dois dólares por dia. Mais da metade moram em cidades e a urbanização continua acelerada no Terceiro Mundo, onde está a maior parte das 50 megalópoles existentes.

Estudiosos afirmam que a explosão demográfica resultou, em grande parte, de inovações e melhoras no campo da medicina e da saúde pública. Caíram as taxas de mortalidade infantil, doenças incuráveis foram vencidas e alongou-se a expectativa de vida. De onde se conclui que descobertas e conquistas individualmente benéficas resultaram em problemas. Ou seja: em termos globais, há gente demais para um único planeta, a nossa bela terra azul.

A superpopulação traz males e situações indesejadas, como escassez de alimentos, aumento da poluição e degradação dos ecossistemas, além da rápida propagação de epidemias, resultante da interconexão entre países e continentes.

Para vencer ou atenuar tais mazelas, aconselham-se providências, começando pela oferta de educação de bom nível para a imensa maioria que ainda é de iletrados e despossuídos. Algo a ver com o nosso amado Brasil?

Em 2050 seremos pouco mais de 218 milhões de brazucas – surpreendentemente, 10 milhões a menos do que em 2040. Isso porque a taxa de fecundidade da mulher brasileira é, agora, de 1,7 filho; em 2050, será de 1,5. O que resultará em mudança na pirâmide demográfica e, igualmente, nas demandas da sociedade. Hoje, crianças e jovens precisam de mais creches e escolas; amanhã teremos idosos a exigir clínicas e serviços especializados.

De onde se conclui que políticas públicas terão de ser revistas e adequadas à nova realidade que se delineia. Alguém duvida da capacidade dos nossos preclaros governantes para efetivar tais mudanças? Ou a “novilíngua” e o “duplipensar” continuarão prevalecendo, então como agora?

(Lena Castello Branco,[email protected])

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