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OPINIÃO

Parabéns, Maurício Sampaio!

Vivemos em um mundo onde tudo que vemos e ouvimos, acreditamos ser real. Mas a verdade não é percebida.

A verdade vem embrulhada em conceitos e padrões definidos. E quando você menos percebe, já foi convencido de que tudo está resolvido, como quer a sociedade.

Na verdade, nascemos em cativeiro, numa prisão que não podemos ver, cheirar ou tocar, porque ela está em nossa mente.

Não queremos raciocinar, formular teses ou questionamentos.

Como nos foi colocada, a verdade é aquela dita pelos detentores do conhecimento, especialistas no assunto discutido, geralmente oriunda de uma elite formada para conduzir toda uma massa de manobra.

Nos dobramos sempre à verdade como nos é apresentada. Nos dobramos. Apenas isso.

Como expectadora, tenho assistido estarrecida pessoas de bem serem execradas, usurpadas e expropriadas de suas vidas, enquanto outras se locupletam do infortúnio alheio.

Em abril de 2008, por determinação do Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás editou o decreto judiciário 525/2008, afastando titulares de cartórios e serventias que não se enquadravam nas regras instituídas pela constituição de 1988. O decreto atingiu vários titulares, entre eles Maurício Sampaio, pelo fato dele ter recebido o cartório de herança, sem atender a exigência do concurso.

Maurício propôs ação anulatória do decreto 525/2008, para manter-se na titularidade do cartório. Seguiu-se uma infinidade de atos processuais e medidas judiciais próprias do rito processual, mas em maio de 2013.

Agora, o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowiski, concedeu liminar para suspender os efeitos da decisão do corregedor do Conselho Nacional de Justiça, que havia declarado vaga a serventia extrajudicial titularizada por Sampaio.

Interessante notar que há, em Goiânia, muitos titulares de cartórios havidos por herança, que não foram afetados pela expropriação em razão do Decreto 525/2008. É bem verdade que este decreto só deveria valer após a morte dos atuais titulares.

Mas com Maurício foi tudo diferente. A sua disputa se tornou pública, e seu nome caiu no juízo da população, que nada tem a ver com a vida desse cidadão.

Em 5 de julho de 2012, Valério Luiz, cronista esportivo, é assassinado na porta da rádio que trabalhava, a 820 AM.

Manuel de Oliveira, pai do cronista esportivo, aparece na mídia desesperado pela morte do filho, e pasmem – com quem não conversava há anos, segundo relatado por parentes próximos a eles. Dizem que quando Valério morreu, estava de relações rompidas com o pai. Imediatamente, Mané de Oliveira desafiou ‘qualquer pessoa a apresentar outro motivo, fora os comentários dele de futebol, como motivação do crime’. Pode ter contido os comentários da população em geral, mas não do próprio neto, Valério Luiz Filho, que levantou outros motivos para a morte do pai. Está tudo na internet.

De lá para cá o circo foi montado.

A consternação do pai Manuel pela morte do filho lhe rendeu uma eleição a deputado estadual. O mais votado. Um pai que sequer conversava com o seu filho, como bem sabem seus familiares, foi eleito em torno da morte do mesmo, segundo muitos comentários postados nas redes sociais.

A pergunta é apenas uma: que grito de clamor por justiça é este levantado por Manuel de Oliveira, que em vida, não mantinha relações paternas com o filho? Poderia ser remorso? Poderia. Justo motivo, por sinal.

O fato é que todo morto vira herói. Depois da morte, as pessoas se tornam boas, pessoas de bem. Depois da morte, ela se livra de seus pecados.

Olhar primeiro para si antes de apontar o dedo a quem quer que seja é um hábito que devíamos cultivar, até por orientação bíblica: “Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidará em tirar o argueiro do olho do teu irmão.”

Triste é ver uma morte trágica como a de Valério Luiz render tantos dividendos a uma família como rendeu a família de Mané de Oliveira.

O circo foi montado e os lucros foram colhidos em cima de uma morte trágica de um homem, com seis tiros. Que coisa horrível! Que repugnante! Que tanto falatório! Já não seria hora de deixar Valério Luiz repousar em paz?

O momento de retomada da titularidade do Cartório por Maurício Sampaio não é uma hora de festa e comemoração. Pelo contrário, é hora de cautela. Inveja é um sentimento humano que tem devastado homens e mulheres através dos tempos. Mas não deveria ser assim porque ninguém é realmente digno de inveja, mas de lástima!, conforme Arthur Schpenhauer.

Não conheço Maurício Sampaio, mas lhe presto aqui minha solidariedade. Ninguém merece ter a vida devastada como teve a sua, uma vez que a vida de cada um só diz respeito a seu titular.

Desejo que seja cauteloso, pois essa vitória é grande demais, e muita gente não a aceitará.

Desejo a ele que recupere toda sua riqueza, e que seu dinheiro venha em dobro.

Desejo que ele não ajude mais pessoas afortunadas, que se aproveitaram de seu dinheiro, patrocinando grandes eventos em âmbito nacional, e depois lhe deram as costas, como urubus que ficam em volta só para se aproveitarem.

Que ele ajude os pobres, aos que choram, aos mansos, aos que tem fome e sede de justiça, aos misericordiosos, aos limpos de coração, aos pacificadores, aos perseguidos por causa da justiça, aos injuriados. Digno é o trabalhador de seu salário (I Tim 5:18).

Que cultive sempre os seus amigos verdadeiros e se alegre com eles, aqueles que ficaram ao seu lado nos momentos mais difíceis por que passou.

Que faça tudo diferente.

Desejo-lhe que seja feliz, o que estendo à sua família. E que, se for a júri popular, lhe seja concedida a absolvição.

Hope for the future to say the days ahead will be the best of all.

(Silvana Marta de Paula Silva, advogada e escritora - Twitter:@silvanamarta15)

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