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Minhas 4ª feiras com o prof. Joffre Marcondes de Rezende (III)

Hélio Moreira ,Especial para Opinião Pública

Naquela 4ª feira havia chovido em Goiânia e algumas ruas foram inundadas, trazendo transtornos para o trânsito, tanto para pedestres como para automóveis, porém, cheguei ao seu apartamento no horário habitual, logo depois de 16hs.

Ao receber-me, com o carinho costumeiro, foi logo dizendo que naquele dia esteve revirando seus guardados, quando se deparou com algumas fotografias da nossa viagem a Europa em 1982; dado o “mote”, passamos a conversar sobre aquele acontecimento.

Foi em maio daquele ano que Joffre e eu tivemos a ideia de viajarmos juntos, aproveitando a realização do Congresso Mundial de Gastroenterologia que seria realizado em Estocolmo, na Suécia, e o Congresso Internacional de Coloproctologia em Munique, ambos no mês de junho; a partir de então, nossas esposas (Marilia e Alzira) passaram a discutir o roteiro da viagem e, devido ao interesse mutuo, incluímos no grupo o casal de anapolinos Dr. Roberto Zacarias e sua esposa Sissi e também nosso filho José Paulo, então com 12 anos de idade; foram muitas reuniões festivas e no final decidimos que primeiramente iríamos a Estocolmo e, aproveitando o fato de estarmos na Europa, programamos “esticar” o passeio, não só por alguns países da Escandinávia, como para a Europa Central (Alemanha, Áustria, Itália, França e Inglaterra).

Em 1972 Marília e eu passamos seis meses em Londres, onde fiz um curso de pós-graduação no Hospital Saint Marks (especializado em coloproctologia) e, naquele ano de 1982, estávamos comemorando dez anos daquela “efeméride”, por isto resolvemos que viajaríamos na frente dos dois casais, levando o José Paulo “a tiracolo” para que ele pudesse, com calma e tempo, conhecer a cidade e o local onde moramos naquela oportunidade.

Após uma semana em Londres, viajamos para Estocolmo, onde encontramos nossos companheiros de viagem; pelo fato de termos demorado a decidir se realmente iríamos, não conseguimos reservas em Hotéis, porém, a comissão organizadora do Congresso conseguiu hospedar-nos na Casa do Estudante (!) desocupada pelo fato de ser época de férias escolares.

Ao chegarmos à Casa, ficamos embevecidos com o que vimos, constituindo, inclusive, em uma agradável surpresa, pois o ambiente era muito organizado, as acomodações (apartamentos) eram confortáveis e, sobretudo, muito bem cuidados, com direito, inclusive, a um bem servido café de manhã; como a sua localização era bastante afastada do local onde se desenrolava o Congresso, fomos surpreendidos com a iniciativa do governo de franquear os transportes coletivos (ônibus e metro) para os congressistas (bastava exibir o “crachá”).

Lembramos, Dr. Joffre e eu, das agradáveis discussões que tivemos com alguns estudantes que permaneceram na casa e que eram oriundos de vários países, principalmente da África, todos falando o inglês, porém já bem adaptados ao idioma sueco; Dr. Joffre, como sempre, procurava entender o que eles falavam utilizando-se de um dicionário que adquirira logo que chegamos a Suécia (aliás em todos os países que visitamos, a primeira coisa que Dr. Joffre fazia era adquirir um dicionário); foram momentos que não esqueceremos!

Após o Congresso fomos para Copenhagen (dois dias), depois Alemanha – Hamburgo (ônibus) fizemos a travessia do Mar do Norte em um enorme barco que cabia dezenas de veículos, inclusive nosso ônibus; de Hamburgo fomos para Munique, onde participei do Congresso Mundial de Coloproctologia e nos intervalos das sessões, visitamos inúmeras atrações turísticas, inclusive alguns Castelos; de lá fomos até Heidelberg (às margens do rio Reno), onde permanecemos por dois dias.

Ficamos entusiasmados com a beleza da cidade de Heidelberg, população ao redor de 70 mil habitantes e aproximadamente 30 mil estudantes (ali está localizada uma das mais antigas Universidades do mundo, mais de 1.000 anos!), ambiente alegre e festivo, principalmente pela presença de uma multidão de jovens circulando pelas suas ruas; confesso que vi similitude entre Heidelberg e Alfenas, MG (desculpem a falta de modéstia), porém verifiquei que a cidade vive quase que em função da sua Universidade, com este turbilhão de jovens estudantes pelas suas ruas e alamedas o que me levou a esta comparação.

No restaurante onde fomos jantar, todo o serviço de atendimento (garçons) era feito pelos estudantes (depois ficamos sabendo que era a regra em toda a cidade); uma linda jovem alemã (cursava medicina) foi quem nos atendeu; após termos sido identificados como médicos, ela redobrou em gentilezas para nos servir. Na despedida perguntei-lhe se podíamos comprar (como souvenir) as taças (que traziam a logomarca do estabelecimento) em que nos serviram o vinho; diante da resposta negativa, perguntei-lhe, para espanto do Dr. Joffre:

– Posso “roubar” duas delas?

Dr. Joffre já queria se despedir, antevendo alguma extravagância de minha parte e qual não foi nossa surpresa ao ouvi-la dizer, piscando um dos olhos:

– Se eu não ver! Prometo que vou fechar os dois olhos, disse-nos quase que num sussurro: – podem levar!

De vez em quando experimento um bom vinho e utilizo a minha taça aqui na Santa Tereza, sempre com a lembrança imorredoura dos compadres Dr. Joffre e dona Alzira.

Voltamos a Munique e de lá descemos de trem para a Itália, com visitas a Roma, Pompéia, Capri e Anacapri; não vou cansar os leitores descrevendo tudo o que vimos, porém, preciso dizer que a companhia do Dr. Joffre, com seu eruditismo cultural, enriqueceu-nos a todos.

Despedimos da Europa em grande estilo, fomos ao nosso derradeiro porto, a cidade de Paris e ali permanecemos por três dias; no dia anterior à nossa despedida, quando circulávamos pela avenida Champs Elysées, escolhemos um dos “cafés” que espalham suas cadeiras pela calçada e pedimos um champanhe “nacional”, quando brindamos o sucesso da nossa viagem e da nossa camaradagem!

Sinto muita saudade do Dr. Joffre!

(Hélio Moreira,  membro da Academia Goiana de Letras, Academia Goiana de Medicina, Instituto Histórico e Geográfico de Goiás)

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