Vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura de 2015, “Tempo de espalhar pedras”, de Estevão Azevedo, chega às livrarias em junho pela Record numa nova edição, com novo projeto gráfico e linda capa. Tem ainda orelha de Leyla Perrone-Moisés e nota extra do autor que detalha algumas de suas muitas referências e inspirações para compor a história.
Ambientada numa vila desgastada pelo garimpo, a trama fala de desesperança, relações deterioradas, vingança e desejo. O enredo é centrado no ódio entre Diogo e Gomes, dois velhos garimpeiros, e seu reflexo na relação complexa entre seus filhos, Ximena e Rodrigo – que mistura o mesmo ódio com uma forte pulsão sexual.
Nascido em Natal mas morando em São Paulo desde muito cedo, Estevão tem uma realidade muito mais fincada no universo urbano de “Nunca o nome do menino”, seu primeiro romance. Foi exatamente o desejo de fugir disso que o atraiu para cenário do garimpo onde se desenrola “Tempo de espalhar pedras”. Estevão descreve com destreza as imagens que compõem a vila de garimpeiros – e ele conta, na nota de autor, que sua pesquisa para isso foi em outras obras grandiosas da ficção como “Cascalho”, de Herberto Sales; “Vidas secas”, de Graciliano Ramos; e “Abril despedaçado”, de Ismail Kadaré, entre outras.
A ideia para a trama, no entanto, veio de um guia de trilhas durante uma viagem à Chapada Diamantina, na Bahia: ele contou a Estevão sobre um vilarejo de garimpo de diamantes que foi paulatinamente destruído pelos moradores depois de eles perceberem que o único local intacto, e que portanto ainda poderia esconder diamantes, era o próprio vilarejo. “Fiquei com essa história, sem saber o quanto tinha de lenda e o quanto de realidade, na cabeça, pois era uma alegoria muito forte da cobiça: era comer da própria carne para não morrer de fome ou, pior, ter acesso aos atrativos do consumo”, conta o autor em entrevista ao Blog da Record.
O livro foi lançado originalmente em 2014 pela Cosac Naify. Na mesma noite em que foi anunciado o Prêmio São Paulo de Literatura para Estevão, em 2015, chegou também a notícia do fim da editora, o que comprometeu a chegada da obra às mãos dos leitores. Agora, “Tempo de espalhar pedras” chega às livrarias pela primeira vez com ampla distribuição.
TRECHO:
“No dia seguinte, ou quando as moedas se acabassem, o que não tardaria a acontecer, Bezerra estaria entre eles. Naquele momento, porém, e porque não costumavam, Ximena e os outros dali, pensar além do que lhes determinasse a sede, a fome, a doença ou o sexo, ela sentiu-se tentada a compartilhar daquele banquete de tão poucas iguarias – uma rede no alpendre, um cigarro, o ócio – mas de tão atípico sabor, e Bezerra pareceu-lhe mais garboso do que fora no dia, na semana, na vida anterior que vivera sem fartura e que tornaria a viver no dia posterior, no seguinte ou ainda no outro, a depender da quantidade de aguardente que bebesse e que pagasse aos outros e da perspicácia das mulheres com quem dormisse.”
Estevão Azevedo nasceu em Natal, no Rio Grande do Norte, mas mora em São Paulo. É mestre em literatura brasileira pela USP e trabalha como editor. Seu primeiro romance, “Nunca o nome do menino” (Record), foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura em 2009. Publicou ainda “O som de nada acontecendo” (contos, Edições K) e narrativas curtas em antologias e revistas na Alemanha e nos Estados Unidos.