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Gatos se tornam amigos ronronantes dos seus tutores

Pesquisa aponta que 61% dos brasileiros possuem pets em casa. Psicóloga, tutora de 12 gatos, afirma que felinos aliviam sintomas de ansiedade

Imagem ilustrativa da imagem Gatos se tornam amigos ronronantes dos seus tutores

Assim como Charles Baudelaire e Julio Cortázar, o escritor João Guimarães Rosa gostava de travar silenciosas batalhas com o texto acompanhado pelos seus gatos. O autor de “Grande Sertão: Veredas”, tão apaixonado pelos bichanos quanto era pela esposa Aracy de Carvalho, causou espanto no ex-presidente Jânio Quadros, que não se segurou durante visita à casa do imortal das letras e achou por bem lhe perguntar as razões que o levavam a criar três felinos.

“Gatos são muito mais fiéis aos donos. Já os cachorros se parecem com certos diplomatas, abanam o rabo para qualquer autoridade”, comparava Guimarães Rosa, embaixador do Brasil em Hamburgo durante o nazismo, entre 1938 e 1942. O mineiro se junta a um seleto time de escritores apaixonados pelos pequenos seres ronronantes. Hemingway, por exemplo, chegou a ter 50 em sua propriedade nos EUA. E William Burroughs, autor de “O Gato por Dentro”, dizia que, de todas as criaturas puras, os gatos são as mais práticas.

Zeca Jagger, meu companheiro felino preto e branco, dois anos, regozija-se durante reuniões de pauta, nas quais os jornalistas, incluindo este escriba, decidem a edição que irá circular no dia seguinte. Já Cazuza, gordo, oito para nove anos, amarelo e branco, quer saber apenas de ficar o dia todo deitado no ar-condicionado, sem maiores aporrinhações, avesso à correia e ao estresse. Enquanto Berenice, angorá branca, felpuda, quatro anos, é brincalhona - e ai de você se, ao fechar a geladeira, tirá-la de lá ou, pior ainda, não correr atrás dela.

Pesquisa

Segundo levantamento realizado pelo Datafolha, 61% dos brasileiros com 16 anos ou mais possuem um pet em casa, sendo que 23% têm rotina semelhante às descritas no último parágrafo. A pesquisa informa ainda que, nos lares que servem de residência para os felinos, 46% dos entrevistadores são tutores de mais de um, como é o meu caso, da minha esposa e da psicóloga Beatriz Breves, especialista em ciência do sentir. Ela, porém, cuida de 12.

Breves esteve, desde pequena, rodeada de bichanos e afirma que os tutores reconhecem a alegria que os pequenos seres ronronantes são capazes de proporcionar no dia a dia, com suas brincadeiras, peripécias, cenas engraçadas, carinho e amor. Mas os benefícios, diz ela, não param por aí: a ciência já comprovou que animais provocam bem-estar nas pessoas, controlam sintomas de ansiedade, diminuem a depressão e auxiliam no aspecto emocional.

Não à toa, um dos impactos está relacionado à saúde mental. Breves catalogou, em 35 anos de estudo, 500 sentimentos proporcionados pelos amigos ronronantes, como momentos de amor, instantes de afetos, companheirismo, felicidade, conforto e gratidão. Autora de “Entre o Mistério e a Ignorância - O Desvendar da Psique Humana”, ela defende ainda a tese segundo a qual, na terceira idade, ter um amigo de quatro patas possibilita vida sem solidão.

Como isso, se os bichanos são traiçoeiros, diz a lenda? Esqueça-a, por favor. Eles amam, da forma deles, é bom dizer, já que nunca abrem mão da independência e, em razão dessa característica de suas personalidades, é comum ouvir humanos preconceituosos - eu sei, soa até redundância. É raro gatos se esfregando nas pessoas sobre as quais odeiam. Talvez só para pedir um pouco de comida, ou, no caso de a coisa estar feia, colocar água na vasilha.

Ao perceber que uma pessoa não lhe quer, o gato parece ensaiar uma travessura, pulando no colo do incauto ou roçando-se suas pernas nas dele. Até esnoba, se você chegar já fazendo carinho, miau, miau, miau: ou, tá pensando o quê?! Pode ser implicante ou vaidoso, dependendo da circunstância, mas é um bom camarada. Quem melhor descreveu-os, nesse sentido, foi a poeta Lygia Fagundes Telles: “Ele fixara em Deus aquele olhar de esmeralda diluída, uma leve poeira de ouro no fundo. E não obedeceria porque gato não obedece.”

Estrela das artes

Inspiraram poetas, se tornaram personagens de contos, objetos de ensaios literários e até protagonizaram games, como “Stray”, aventura felina em terceira pessoa na qual o jogador passa por becos iluminados pelos néons numa cidade futurista, andando por obscuros locais do submundo, interagindo com o espaço urbano e vendo tudo a partir dos olhos de gato. Há muito já são famosos na indústria cultural, vide Mingau, da “Turma da Mônica”, Tom, personagem da animação “Tom & Jerry", e “ Gato de Botas”, que pode até ser oscarizado.

A prova da popularidade ocorreu em 1961, quando 152 gatos pretos formaram fila para a gravação da adaptação cinematográfica do conto “The Black Cat", escrito por Edgar Allan Poe. Publicado em agosto de 1843 nas páginas do “Saturday Evening Post”, a obra assinada pelo autor norte-americano descreve Pluto, mascote favorito e era com ele que o protagonista do enredo passava mais tempo. “Era só eu que o alimentava e o animal me acompanhava em qualquer parte da casa em que eu fosse”, escreve Allan Poe.

Já Charles Baudelaire, em “O Gato”, poema que integra a obra “As Flores do Mal”, dedicou belos versos aos felinos: “em teus belos olhos afundo e pouso em mesclas d´aço e de ágata”. Se Charles Bukowski os admirava pela capacidade de dormir 20 horas seguidas, a ensaísta Patricia Highsmith gostava dos bichanos porque, segundo ela, são “elegantes e silenciosos, e têm efeito decorativos; uns leoenzinhos razoavelmente dóceis, andando pela casa”.

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