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'Partida' discute Brasil e suas contradições

“Vai contra o processo histórico apresentar a obra reformista como uma revolução prolongada, a longo prazo, e a revolução como uma série condensada de reformas”, diz Rosa Luxemburgo, a marxista águia da revolução que teve sua vida ceifada por radicais de extrema direita, mas cujas ideias vêm à tona cada vez que a esquerda entra em crise. Luxemburgo, assim como o bolchevique Leon Trotsky, era adepta da ruptura radical com o capital, no entanto, antes de ter sua vida interrompida por brucutus totalitários, ela alertou a humanidade para os perigos que se vislumbravam com a ascensão de Joseph Stalin.

A análise, além de ser lembrada como um contraponto ao regime soviético, entrou em pauta pela atriz Georgette Fadel numa discussão com o empresário Léo Steinbruch em cena que faz parte do docuficção “Partida”, que chega hoje às plataformas Now, Vivo Play, Oi Play, Petra Belas Artes e Looke. Diante do resultado da última eleição no Brasil, Fadel prometeu se candidatar à Presidência da República em 2022 por um partido composto apenas por mulheres, o Partida. Era preciso se posicionar contra o fascismo, ela deixa claro. E sai atrás da utopia de passar a virada de ano ao lado de Pepe Mujica, sua maior inspiração política viva.

EXCLUSIVO: Assista a uma cena do premiado documentário 'Partida ...
Ator Caco Ciocler fala sobre processos políticos e históricos do Brasil - Foto: Divulgação

Em um primeiro momento, a ideia do diretor Caco Ciocler era captar o pensamento político de Fadel com ela dirigindo e ele filmando, mas aí começaram a pensar num filme e, se era pra ser um longa-metragem, haveria a necessidade de ter outra câmera, de mais pessoas para cuidar do som, essas coisas típicas da labuta cinematográfica. À medida que a equipe de produção foi sendo formada, os personagens começaram a surgir. “Cada um (membro da equipe) vinha com uma demanda e essa demanda foi sendo incorporada ao que a gente poderia chamar de pré-roteiro, e acabou virando uma representação de um microcosmo”, afirma Ciocler, com exclusividade, ao Diário da Manhã.

Para o projeto andar, o carro deu lugar ao ônibus. E nele houve de tudo: momentos de tédio, de treta – tretas, inclusive, rolaram em diferentes partes da narrativa – de tensão, de dúvida, de afeto. Mas, como fruto de uma sociedade onde o racismo é institucional, o motorista da condução era negro. “O que a gente pôde fazer foi reconhecer. Esse filme só funcionaria se a gente revelasse não só as nossas qualidades, mas principalmente os nossos piores lados. Porque a função do artista não é a glória, e sim botar na roda aquilo que precisa ser transformado”, confessa Ciocler, cujos trechos do filme são uma metonímia em tempos de Black Matter Lives.

Num momento dado do longa, mais especificamente durante uma briga entre Georgette Fadel, atriz, e Léo Steinbruch, empresário de direita, a câmera chama atenção para o motorista Jefferson. “O mínimo era assumir e registrar, ter consciência dele (do racismo estrutural)”, relata Ciocler. Jefferson caiu de pára-quedas na história, no último minuto, seis horas antes da partida, pra ser mais exato, e trouxe consigo questões que tinham até então passadas despercebidas. “A gente não conhecia ele. O ônibus que a gente ia, não me lembro da história direito, quebrou. Achamos esse, que achamos uma graça visualmente”, narra o diretor.  

Mas, vem cá, Ciocler, como você enxerga o filme hoje? “A lembrança que eu tenho de 2018, e o filme retrata isso, é que a gente já vivia num país partido, num país legitimado pelo discurso de ódio. A diferença de lá pra cá é que as porcentagens mudaram”, afirma o diretor de “Partida”, acrescentando: “o simbolismo daquele ônibus, que estamos todos naquele ônibus, do afeto, talvez a possibilidade única de entendimento, da importância de se ter um objetivo em comum, de se projetar uma utopia, de ir atrás dessa utopia e de se construir quando se vai atrás. Neste sentido, acho que o filme ganhou dimensões impensáveis”, arremata.

Segundo documentário de Caco Ciocler, “Partida” estreou na 43ª Mostra Internacional de Cinema, em São Paulo, e entrou para a lista dos longas mais bem avaliados pelo público naquela edição. O filme foi exibido ainda no 21º Festival do Rio, como parte da Première Brasil - Mostra Fronteiras, e conquistou quatro prêmios no 14º Fest Aruanda, em João Pessoa: Prêmio Especial do Júri de Melhor Filme, Melhor Som para Vasco Pimentel, Melhor Atriz para Georgette Fadel e Melhor Montagem para Tiago Marinho. A produção também foi selecionada para o 23º Festival de Málaga, na Espanha. “Partida”, de fato, é uma ode à utopia.

Ficha Técnica

‘Partida’

Autor: Caco Ciocler

Gênero: Docuficção

Disponível nas plataformas Now, Vivo Play, Oi Play, Petra Belas Artes e Looke

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