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‘Aeroporto Central’, de Karim Aïnouz, mostra refugiados em aeroporto construído no nazismo

Um dos nomes mais inventivos do nosso cinema, o diretor Karim Aïnouz emenda um filme atrás do outro. E sempre com características distintas: flertou com o drama biográfico em “Madame Satã” (2002), dirigiu o clássico “O Céu de Suely” (2006), criou o road-movie “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo” (2009), concebeu o drama premiado “O Abismo Prateado” (2011), roteirizou o curta documental “Domingo” (2014) e, no mesmo ano, fez ainda o longa “Praia do Futuro”. Como se não bastasse, houve tempo para realizar o melodrama “A Vida Invisível” (2019), que concorreu ao Oscar neste ano.

Com currículo extenso nas ficções, Karim decidiu voltar-se para o documentário. O longa-metragem “Aeroporto Central”, exibido em mais de 30 festivais internacionais e laureado na Mostra Panorama do 68º Festival de Berlim com o prêmio Anistia Internacional, estreia nesta sexta-feira (24) nas plataformas de streaming. Em seu novo filme, o diretor traz um tema particularmente sensível em tempos onde a extrema direita se consolida no cenário político mundial: os refugiados e a batalha que travam para mudar de vida. “A gente não planejou”, diz o cineasta, por telefone, ao Diário da Manhã. “É um filme de espera”.

Ibrahim Al-Hussein em cena do documentário - Foto: Juan Sarmiento/ Divulgação

O documentário acompanha os jovens sírio Ibrahim Al-Hussein e iraquiano Qutaiba, moradores de um dos hangares de Tempelhof, aeroporto transformado em abrigo para os recém-chegados a Berlim, capital da Alemanha. “Não sabemos como vamos nos colocar diante do problema, pois são personagens que estão vivendo uma guerra. Temos muito a aprender com eles”, afirma Karim, que acompanhou os passos dos dois em terras alemãs, onde mora, entre os anos de 2015 e 2019. Curiosamente, o galpão em que se passa boa parte do filme foi construído pelo nazista Adolf Hitler e tornou-se espaço de acolhida a imigrantes.

"Não sabemos como vamos nos colocar diante do problema, pois são personagens que estão vivendo uma guerra " Karim Aïnouz, cineasta

À medida que buscam ajustar-se ao cotidiano transitório guiado por entrevistas com o serviço social, aulas de alemão e exames médicos, os protagonistas de “Aeroporto Central” lidam com a saudade do país natal e a ansiedade para saber se poderão residir na Alemanha ou se serão deportados. De fato, a condução cinematográfica de Karim (que trata muitas vezes o aeroporto como um personagem da narrativa) deu conta de algo que o jornalismo factual não conseguia à época: mostrar humanamente quem eram as pessoas que chegavam aos montes ao país europeu, fugindo de uma guerra civil movida à carnificina de tiranos autocratas.

Ancine

Apesar do desmonte da Agência Nacional de Cinema (Ancine) promovido pelo governo de Jair Bolsonaro, o cineasta Karim Aïnouz acredita que o audiovisual “está bombando” no momento. “É o que está nos mantendo vivo nesta quarentena”, avalia. No entanto, Karim reconhece que o governo federal se esforça para “sangrar a Ancine”. “É um momento muito sério, mas essa ignorância irá acabar”, analisa. Por isso, mesmo com proposito da cúpula do ex-capitão de silenciar a produção audiovisual no Brasil, o realizador crê que não haverá interrupção de um cinema “vibrante” no País nos próximos anos.

Diretor Karim Aïnouz - Foto: Bob Wolfeson/ Divulgação

“Eu acredito que o nosso cinema é realmente impressionante. Em 2002, na época no meu primeiro longa, “Madame Satã”, não havia tanta diversidade. Eram poucos, por exemplo, os negros que contavam suas histórias”, lembra o diretor. Realmente, aumentou a qualidade e o reconhecimento mundial dos filmes realizados no Brasil, e as plateias que ovacionam nosso cinema ao redor do mundo é fruto do estímulo do setor público, que passara a investir no audiovisual nos anos 2000 e 2010. “Além disso, entendemos a importância de contar as nossas histórias. Portanto, quando passar essa loucura acho que essa gente será internada”.

“Eu acredito que o nosso cinema é realmente impressionante"

Karim Aïnouz, cineasta

Em setembro do ano passado, numa ofensiva contra a Ancine, o presidente Jair Bolsonaro cortou 43% do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). Trata-se da menor dotação nominal para o fundo desde 2012, quando o FSA recebeu R$ 112,36 milhões. A medida ainda diminuiu apoio a projetos audiovisuais que desagradam o ex-capitão. Ex-global, a namoradinha do Brasil, Regina Duarte, assumiu a secretaria da cultura após Roberto Alvim ser demitido por plagiar discurso do nazista Joseph Goebbels. Regina tinha como missão cessar a bateção de cabeça na pasta. Mas ela está com atuação modesta até agora. E as cabeças seguem batendo.

Serviço

Estreia de ‘Aeroporto Central’

Quando: nesta sexta-feira (24)

Onde: Now, Vivo Play, Oi Play, Itunes, Google+, Filme Filme e Looke

Ficha Técnica

‘Aeroporto Central’

Gênero: Documentário

Diretor: Karim Aïnouz

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