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“Tudo o que ele faz tem uma assinatura”

Um gênio! É dessa forma que a classe artística se refere ao músico acreano João Donato, 85, o maior nome vivo da Música Popular Brasileira (MPB). Dono de um estilo singular, Donato foi um dos expoentes – ao lado de Tom Jobim, Vinícius de Moraes e João Gilberto – da bossa-nova, gênero que despontara na década de 1950 ao misturar jazz com samba. E, agora, após revolucionar a música de diversas maneiras, ele selou parceria com a cantora paulista Tulipa Ruiz.

A ideia de gravar uma música juntos nasceu durante as sessões de ensaio para o show que ambos realizaram no festival Bananada, que aconteceu entre os dias 12 e 18 de agosto, em Goiânia. Tulipa, no entanto, já havia tocado com João Donato na música “Taretá”, que faz parte do disco “Dancê”, de 2015. Um ano antes, o instrumentista chamou a cantora para participar do relançamento de “Quem é Quem”, disco lançado em 1973, no Sesc Pinheiros, em São Paulo.

Em entrevista exclusiva ao Diário da Manhã, a cantora Tulipa Ruiz relata, entre outras coisas, como foi o processo de composição ao lado de Donato. Além disso, relatou a maneira com que nasceu a ideia de tocarem no Bananada. Também reafirmou a importância de haver confluência entre gerações distintas de músicos. E, por fim, criticou o descaso do presidente Jair Bolsonaro em relação às políticas culturais.

Confira a entrevista na íntegra:

Diário da Manhã: Quando nasceu a ideia de duas gerações da Música Popular Brasileira se unissem para gravar um single?

Tulipa Ruiz - A primeira vez que João se aproximou de nós foi nos preparativos do Rock in Rio de 2011. Seu filho, Donatinho, havia participado de Efêmera, meu primeiro disco lançado no ano anterior, e Donato apareceu em uma coletiva com um arranjo para a música título em um pedaço de papel. Ele se aproximou da gente. Na hora de tocar ele não encontrava a anotação e, claro, improvisou maravilhosamente. Tenho essa anotação enquadrada na sala da minha casa. O astral desse encontro deixou a gente com vontade de fazer mais som. E aos poucos isso foi acontecendo.

DM - Como surgiu essa ideia de vocês dois gravarem canções e se apresentarem pelo País, inclusive no festival Bananada, em Goiânia?

Tulipa - Quando Donato apresentou seu disco célebre “Quem é Quem” pela primeira vez, em 2014, com o diretor artístico Marcos Valle após os shows de São Paulo, eles me convidaram para participar do Festival RecBeat, em Recife, e foi incrível. Depois eu e meu irmão Gustavo Ruiz homenageamos Donato em nosso disco com uma música chamada Tafetá. É uma declaração de amor para ele. Então ficou aquele gostinho de “por que não mais som com o João?”. Quando o Fabrício Nobre convidou a gente pra tocar no Bananada pensamos juntos que o show deveria ser muito especial. Na hora veio o Donato, né? Nosso envolvimento foi tanto que eu e Gustavo, meu irmão, aumentamos o Pipoco da Galáxia, minha banda com Samuel Fraga, bateria, e Gabriel “Bubu” Mayall, baixo, que ganhou o trombone de Douglas Antunes, do Bixiga 70, instrumento favorito de João.

DM - João Donato é considerado um dos maiores músicos da MPB. Esteve em contato direto com nomes como Vinícius de Moraes, Tom Jobim e outros durante a Bossa Nova. Qual é a sensação de tocar ao lado de uma lenda viva da nossa música?

Apresentação de João Donato foi uma das mais aguardadas do Bananada - FOTO: MÍDIA NINJA/ REPRODUÇÃO

Tulipa - Passando o dia com João, saindo para jantar, ensaiando, jogando conversa fora, a gente sente que esse homem respira música. Tudo o que ele faz tem uma assinatura. Em poucos dias de convivência qualquer um já começa a adotar suas frases de efeito, sempre hilariantes, sempre renovadas. João tem bossa e é atemporal. Está sempre presente no agora.

DM - Após o compacto de duas músicas inéditas que vocês lançaram recentemente, quais são os planos para o futuro? Tem mais alguma música por vir?

Tulipa - Sempre tem música por vir. A ideia é irmos juntando até formar um disco, caso elas surjam, é claro. Quanto aos shows, temos já algumas datas no Brasil e queremos viajar para fora. Já pensou?

DM - Na música ‘Manjeirição’, o rapper Edgar faz participação especial. Por que unir um ícone da MPB com duas figuras importantes da nova safra?

Tulipa - Por incrível que pareça isso surgiu espontaneamente. Edgar estava no mesmo período em que gravamos no estúdio da Red Bull fazendo um workshop de upcycling no mesmo prédio. Chamamos ele para ouvir o que estávamos fazendo e a empatia foi imediata.

DM - Como vocês veem a Música Brasileira no momento?

Tulipa - A música brasileira é a efervescência de sempre. Infelizmente, temos perdido muitos nomes fundamentais para a música atual, devido a idade. Felizmente as novas gerações se manifestam de uma maneira plural, mantendo o fervo.

DM - O que pensa sobre as políticas culturais e críticas direcionadas pelo presidente Jair Bolsonaro à classe artística?

Tulipa - Ele não tem nenhuma, não se interessa, mesmo porque sequer tem acesso a isso, o que é uma pena.

Tulipa diz que convivência com Donato faz com que qualquer “um já começa a adotar suas frases de efeito” - FOTO: MÍDIA NINJA/ REPRODUÇÃO

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