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CULTURA

Refletindo a atualidade

Rariana Pinheiro 

As estruturas que sustentam o capitalismo, a futilidade, o comodismo e a alienação da burguesia são alguns dos temas tocados no espetáculo “Teorema 21”. Inspirada na obra “Teorema”, do cineasta, escritor e poeta italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975), a peça foi produzida pelos paulistas do Grupo XIX de Teatro e será encenada no Museu de Arte de Goiânia neste sábado (17), às 16 horas. As apresentações são gratuitas.

Com direção de Luiz Fernando Marques e dramaturgia de Alexandre Dal Farra (indicado ao prêmio APCA em 2014), eles optaram por sempre encenar a peça ao entardecer e em espaços não convencionais, preferencialmente abandonados ou deteriorados pelo tempo. A plateia é inserida no interior da suposta sala de estar - que é o cenário do espetáculo - e fica acomodada em cadeiras giratórias dispostas aleatoriamente.

Dessa forma, pode girar as cadeiras para escolher o melhor ângulo para cada cena. “O público pode esperar uma visão bastante ácida do nosso momento atual e, ao mesmo tempo, encontrar uma forma de teatro contemporânea, que trabalha com espaços não-convencionais e presença do espectador no jogo da encenação”, comenta a atriz, Janaina Leite, que, além de atuar, também ajudou na dramaturgia da peça.

Aliás, os diretores fizeram um formato de criação da montagem de forma que os atores também colaborassem com criação do espetáculo. “Trabalhamos juntos desde o início do projeto, com revisões no texto, mudanças, experimentação das cenas de maneira muito orgânica. Destaco também o envolvimento no trabalho dos atores que, além da participação no processo, exercem outras funções, como a criação dos figurinos de Juliana Sanches e o cenário de Rodolfo Amorim”, explica o diretor Marques.

CRIAÇÃO

Pier Paolo Pasolini é considerado um dos maiores artistas italianos do século XX - FOTO: REPRODUÇÃO

“Teorema” estreou no cinema em 1968, e ganhou uma versão literária, escrita pelo próprio Pasolini, no mesmo ano. E a peça é inspirada nos dois. “Convidamos o dramaturgo Alexandre Dal Farra para analisar os recursos narrativos que são diferentemente empregados no livro e no filme homônimo, levantando hipóteses para um possível recorte, agora, no teatro. Não se trata de uma adaptação, mas de uma recriação da obra citada com texto inédito”, explica Luiz Fernando Marques.

Para montar “Teorema 21” - que é uma livre a adaptação de “Teorema” -, o diretor, dramaturgo e atores beberam ainda de outras fontes, como os filmes: “Dente Canino” (Giorgos Lanthimos, 2009), “Funny Games” (Michael Haneke, 1997) e o “Saló” (1975), do próprio Pasolini. “Saló” foi o último e um dos seus mais polêmicos filmes.

No drama, um casal (interpretado por Ronaldo Serruya e Juliana Sanches) volta com os filhos (vividos por Bruna Betito e Paulo Celestino) e a empregada (a atriz Janaina Leite) ao seu antigo lar. No local tudo continua igual, nada parece surpreender a rotina. A chegada de um estrangeiro (o ator Rodolfo Amorim) traz uma mudança sólida na vida dos moradores.

Para contar essa história escrita no final da década de 1960, o grupo aliou discursos atuais ao texto de Pasolini. “Não se trata de pensar sobre as alterações das relações familiares, mas, sim, nas mudanças na dinâmica do próprio capital e na sua relação com a ideologia. O capitalismo ainda precisa de ideologia? Talvez essa seja a questão central da peça, ao meu ver”, explica Dal Farra.

Para Luiz Fernando Marques, a peça é a tentativa de falar sobre um mal-estar geral do mundo contemporâneo. “A obra de Pasolini é muito importante, muito presente na peça, é a alegoria da burguesia. Só que no início dos anos 60 essa burguesia estava assentada numa classe e de certa forma representada pela estrutura familiar. Em Teorema 21 é como se essa classe burguesa, ou essa ideologia, tivesse se esparramado para todas as classes”, comenta Marques.

Cena do filme “Teorema”, de Pasolini, que influenciou a peça de mesmo nome (FOTO: REPRODUÇÃO

Ele ainda complementa que a peça poderia se passar em qualquer lugar do mundo. “A burguesia é igual em todos os lugares. Temos a sensação de que esse capital mesmo desgastado, em crise, não consegue ser desmontado. Ele não se destrói, ele permanece. O nosso “Teorema” olha para o horror do nosso tempo, o fascismo em ascensão, mas encara que as nossas principais forças revolucionárias também seguem sendo tragadas, capitalizadas pelo poder.

PASOLINI

Foi considerado um artista visionário e que fazia duras críticas ao consumismo. entrou tardiamente para o cinema, tendo sido a literatura e a poesia seu canal de expressão da realidade por muitos anos. Menos conhecida ainda é sua obra teatral. É considerado um pioneiro, um autor multimídia, e o cineasta italiano mais estudado, mesmo antes de sua morte.

Homossexual, foi brutalmente assassinado em novembro de 1975. O processo judicial concluiu que foi morto por um garoto de programa, porém essa versão é contestada até hoje. Pasolini morreu um dia depois de voltar de Estocolmo, onde havia se reunido com Ingmar Bergman e outros representantes da vanguarda cinematográfica sueca, e de ter dado uma entrevista à revista L'Espresso com declarações polêmicas sobre tema favorito: "Considero o consumismo como uma forma de fascismo pior que a versão clássica".

Serviço:

Espetáculo Teorema XXI

Quando: sábado, dia 17, às 16 horas

Onde: Museu de Arte de Goiânia

Endereço: Rua 1, número 65, Bosque dos Buritis, Setor Oeste

Entrada franca

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