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Cartier-Bresson elevou o fotojornalismo ao status de arte

“Para mim, a máquina fotográfica é uma verdadeira amante (...) A câmera é o prolongamento do meu olho”, dizia o francês Henri Cartier-Bresson, ao ser questionado sobre fotografia. “Ela nos dá vontade de encerrar o mundo inteiro numa caixinha, com todos os detalhes significativos que fazem o encanto da existência”, completava ele, que é considerado ao lado dos fotógrafos Lewis Hine e Robert Capa um dos maiores nomes do fotojornalismo no século XX.

Morto no dia 3 de agosto de 2004, em Céreste, na França, Bresson é dono de uma obra grandiosa que lhe colocou na galeria dos maiores nomes das artes contemporâneas. Era dotado de curiosidade insaciável e tinha a fotografia como uma de suas maiores paixões. Aos 38, ele ingressou no fotojornalismo e registrou com seu olhar fatos e personalidades que marcaram o século XX, como os filósofos Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir, ambos em 1946, e a fila para visitar o túmulo de Lenin, no ano de 1954.

O que fascina na fotografia de Bresson é que o olhar dele em nenhum momento perturba a ordem das coisas, e isso seja talvez a principal característica da imagens clicadas pelo francês ao longo de sua carreira. São quase “como um gato, sem incomodar”, conforme ele mesmo conta em “O momento decisivo", livro lançado em 1952. Tão clássicas em suas formas, as fotos estão gravadas na memória histórica do fotojornalismo e são estudadas a fio nas universidades de fotografia e comunicação social.

Bresson contribuiu para dar nobreza à fotografia em um momento em que ela era pouco conhecida. Talvez sem se dar conta, ele originou toda uma geração de fotojornalistas que, no contexto pós-guerra, sentiram-se em casa na rua. Por mais que não gostasse do rótulo de jornalista, ele fora testemunha ocular dos principais acontecimentos que chacoalharam o mundo no último século, quer seja a libertação de Paris, ou, em 1949, os últimos dias do Kuomintang, em Pequim.

Foto: Cartier-Bresson

“Eu acho muito foda o fato de que ele foi uma pessoa que fotografou grandes momentos”, diz a fotojornalista Júlia Lee, 23, ao Diário da Manhã. Ela conta que suas fotografias possuem inspiração em Bresson - “especialmente essa coisa do preto e branco” - e que a capacidade do francês transformar o banal em poesia é uma das características que mais gosta nele. “Ele esteve onde poucas pessoas tiveram e retratou esses lugares com o olhar que tinha. Poucos fotojornalistas tiveram essa chance.”

Como dizia Bresson: "Para compreender a história, é preciso conservar uma certa forma de inocência. Meu único segredo foi tomar meu tempo e, sobretudo, tomar o tempo necessário para viver com as pessoas ... e, depois, saber esquecer". Apesar do reconhecimento que teve, o culto a Bresson diminuiu nos últimos anos de sua vida. O pai da fotografia passou a ser contestado, coisa que antes era impensável. A partir de 1973, dedicou-se ao desenho, a lápis e carvão, porém sem o sucesso das fotos.

Dinheiro não era problema

Nascido em 1908, em Chanteloup, próximo a Paris, Henri Cartier-Bresson cresceu em um ambiente onde dinheiro não era problema e estudou pintura com o artista plástico André Lhote. Movido pelas teorias do escritor André Breton sobre o acaso, a revolta e intuição, Bresson foi influenciado pelo movimento surrealista no começo de sua vida. Chegou à fotografia nos anos de 1930 por meio do fotojornalismo, que ele comparava à instantaneidade do desenho.

O fotojornalista carregava uma máquina fotográfica e um caderno de anotações consigo sempre. Dizia que havia encontrado seu senso de composição apenas três dias depois de ter começado a usar sua pequena Leica. Em seguida, mudou-se para Nova Iorque e iniciou-se na montagem fotográfica com Paul Strand. Anos depois, em 1937, casou-se com Ratna Mohini, uma dançarina javanesa. Foi assistente do diretor Jean Renoir em três filmes dele.

Em 1940, no ápice da Segunda Guerra Mundial, Bresson chegou a ser feito prisioneiro de guerra nos Vosges, prisão que ficava numa cadeia de montanhas na França. Conseguiu, contudo, escapar de lá tempos depois. Em seguida, entrou para o mundo dos grandes ao receber uma homenagem do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, após a guerra. Todos acreditavam que Bresson havia morrido nos anos de carnificina, mas ele reapareceu algum tempo depois, e suas fotos passaram a ser reverenciadas.

Foto: Cartier-Bresson

Ao término da guerra, o fotojornalista voltou a trabalhar com cinema, dessa vez no documentário sobre o conflito mundial “Return to life”, de 1945, cujos gastos foram financiados pelo escritório de informação bélica dos Estados Unidos. Dois anos depois, Bresson, Capa e outros nomes de peso da fotografia fundaram a agência Magnum, sociedade cooperativa criada com objetivo de tornar o fotógrafo independente das exigências feitas pelas revistas na época.

Seus olhos e de sua companheira Leica fecharam-se de vez há 15 anos, mas permanecem ainda hoje como referência no fotojornalismo moderno. É possível separar a história da arte de escrever com a luz em duas formas: antes e depois de Cartier-Bresson. Que seu legado siga vivo por anos e anos.

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