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Arnaldo Antunes lança livro, inaugura exposição e prepara disco

SÃO PAULO - Arnaldo Antunes é um homem da palavra. Depois de deixar os Titãs, 23 anos atrás, ele se tornou um artista plural, cuja matéria-prima de trabalho é a célula de todas as línguas. Além da música, pela qual se expressa desde sempre em sua carreira, estendeu seus domínios por outras linguagens, como a literatura e as artes plásticas. Não surpreende, portanto, o lançamento do livro de poesias “Agora aqui ninguém precisa de si”, a inauguração da exposição “Palavra em movimento” e a preparação de um novo disco. Ele também participa da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) no dia 4 de julho, na mesa “Desperdiçando versos”, com a cantora e, agora, escritora Karina Buhr. Tudo ao mesmo tempo agora.

— A paixão pela palavra vem de tudo — diz Arnaldo, na sala de sua casa na Vila Madalena, Zona Oeste de São Paulo. — Vem da canção popular, que é a palavra cantada, vem da poesia, que é a palavra escrita, vem de alguns trabalhos visuais, do cinema. É uma paixão genuína desde adolescente, quando comecei a curtir as revistas de poesia e escutar os discos de música popular. Vivi uma adolescência nos anos 1970, num período em que essas coisas estavam muito próximas. Os links entre essas linguagens eram muito evidentes. De certa forma, isso me motivou a também começar a criar, escrever e compor. Acho que eu sou um pouco herança dessa geração em que a MPB estava muito próxima da poesia. Tanto que surgiram ali vários poetas que frequentaram tanto livros quanto canções, como Torquato Neto, (Paulo) Leminski, Waly Salomão...

“Agora aqui ninguém precisa de si”, que sai pela Companhia das Letras, será lançado na próxima terça-feira, às 20h, no Cine Joia, região central de São Paulo, com uma performance poética do autor, acompanhada de projeções da videoartista Marcia Xavier. O livro reúne 65 poemas produzidos ao longo dos últimos cinco anos — alguns até mais antigos. Iniciado com “nada” e encerrado em “silêncio”, traz versos escritos, gráficos e desenhados, composições fotográficas e até um recorte de notícia de jornal.

Arnaldo conta que surgiu há um ano a ideia de dar corpo aos escritos armazenados no seu computador, em diferentes estágios de criação:

— Foi quando eu resolvi que aquilo daria pra ser um embrião de livro. Comecei a pensar no tratamento gráfico e a fazer novos poemas para integrar a esse corpo. É aí que entra o processo de dar coesão para um conjunto feito com coisas soltas. Uma vez que você reúne aquilo e tem uma primeira cara, existe uma motivação que vai chegando.

MÚSICAS COMPOSTAS NAS FÉRIAS

Inspirado em poema de Manuel Bandeira, “poema tirado de uma notícia de jornal 2” reproduz em uma página a notícia de mãe e filha resgatadas pela polícia de uma situação de desespero e penúria em um bairro paulistano de periferia. E revela um pouco do processo criativo do poeta e compositor:

— É uma notícia de jornal que guardei durante muitos anos, porque me surpreendeu, é uma história muito tocante. Tive a ideia de colocar aquilo como um diálogo com o poema do Manuel Bandeira, que tem um poema tirado de uma notícia de jornal, no qual ele faz talvez uma colagem de notícias. Talvez tenha sido o primeiro ready-made da poesia brasileira. Eu quis radicalizar isso: colocar a notícia de jornal mesmo. E não é uma notícia qualquer, foi algo que guardei, pois me impressionou.

Os “guardados” de Arnaldo também estarão na exposição “Palavra em movimento”, que começa no dia 11 de julho, no Centro Cultural Correios de São Paulo, região central da cidade. São caligrafias, colagens, instalações e objetos, entre outras obras, realizados pelo artista ao longo de 30 anos. No segundo semestre, a mostra segue para Brasília (Museu Nacional dos Correios), de 10 de setembro a 8 de novembro, e no ano que vem vai para o Rio (Centro Cultural Correios), de 2 de março a 1º de maio.

A exposição propõe um passeio pela produção que ele mesmo chama de “verbivocovisual”, termo cunhado pelo escritor James Joyce, e apropriado nos anos 1950 pelos concretistas brasileiros, que demonstra o interesse pela dimensão verbal, visual e sonora da poesia e, de certa forma, abre espaço para as outras linguagens. Estão reunidas ali desde a produção recente, como a série “O interno exterior” (2014), na qual porta-retratos digitais se tornam suporte para poemas criados com fotografias de letreiros animadas em stop motion, até obras antigas, como a série “Oráculo” (1981), conjunto de colagens com rasgos manuais sobre pequenos papéis cartonados com sobreposições de imagens, letras, fontes e palavras recortadas de revistas e jornais da época.

— Não me considero artista plástico no sentido específico, meu trabalho envolve a palavra sempre — explica ele. — Vejo mais como poesia visual ou a poesia indo para outros suportes e se aproveitando de outras linguagens para acontecer. Então, ela vai pro objeto, pro cartaz, pro vídeo, vai pro áudio, às vezes. Mas tudo, de certa forma, podendo ser mostrado numa exposição que seria como o meio das artes plásticas. Mas isso depende um pouco da significação poética. Assim como não sou músico instrumental, sou um compositor que trabalha com a palavra cantada. Então, a palavra, de certa forma, aparece em toda a minha produção e faz a ponte entre todas essas linguagens.

Arnaldo prepara também um disco, que começou a gravar esta semana no Rio e deve sair apenas no segundo semestre por seu selo, o Rosa Celeste. É uma reunião de músicas compostas durante um período sabático de seis meses (entre o fim do ano passado e o início deste) em que percorreu Estados Unidos, Índia e Itália. Diz ele que sem a demanda das “encomendas” a produção fica muito mais “espontânea”:

— O momento em que eu mais gosto de compor, ficar tocando e fazer música é quando tiro férias. Principalmente para compor e escrever sem destino certo. Isso é o gostoso das férias. Fiz várias viagens e juntou tudo. Mas está tudo muito no começo. No estúdio muitas coisas vão mudar ainda. Por isso, não dá para falar muito.

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