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COTIDIANO

A irracionalidade das multidões

A situação política no Brasil nos últimos anos tem re­sultado na polarização da sociedade, principalmente após as eleições de 2014, na qual Dil­ma Rousseff derrotou Aécio Neves por uma margem estreita. Embo­ra tenha vencido nas urnas, Dil­ma foi impeachmada. E, mais re­centemente, o ex-presidente mais popular da história da República brasileira, Luiz Inácio Lula da Sil­va, foi preso, após ser condenado por corrupção. O clima tenso na política passou a fazer parte do dia a dia das pessoas, seja nos bares, nas casas e nos trabalhos.

Esses sentimentos, alimentados pelos escândalos de corrupção e por decisões da Justiça que contrariam uma ou outra parte da polarização, exemplificam o acontecimento em 2013, em que pessoas com cami­sas vermelhas foram espancadas em manifestações verde-amarelas. Críticas à política social do governo, que só eram ouvidas dentro de casa nos últimos anos, agora são explici­tadas em cartazes nas ruas.

Com a prisão de Lula, os ma­nifestantes permanecem com os sentimentos aflorados, tornando­-se mais comum os conflitos en­tre grupos a favor e contra a prisão do ex-presidente. Como por exem­plo, no dia 5 de abril, um ex-verea­dor petista, Manoel Eduardo Mari­nho, conhecido como Maninho do PT, participava de uma manifesta­ção em frente ao Instituto Lula, e foi acusado de agredir um mani­festante. De acordo com o delega­do Wilson Zampieri, o ex-vereador deu um empurrão que derrubou o administrador Carlos Alberto Bet­toni, que é contra o Lula. No dia da manifestação, Bettoni teria aguar­dado a saída de petistas do institu­to e interrompeu uma entrevista do líder do PT no Senado, Lindbergh Farias (RJ), chamando-o com pala­vras de baixo calão. Além de Mani­nho, apoiadores de Lula afastaram o manifestante com empurrões e chutes. No entanto, o último em­purrão foi dado pelo ex-vereador, e com a queda, o administrador ba­teu a cabeça no para-choque de um caminhão e teve traumatismo cra­niano. Há suspeita de que o filho do político também esteja envolvido.

O ato de violência mais recen­te aconteceu na última terça-fei­ra, 17. Um grupo do Movimen­to dos Trabalhadores Sem Terra (MST) foi agredido por integrantes de uma torcida organizada de fute­bol Império Alviverde, do Coritiba. A agressão aconteceu no mesmo dia em que foi realizada uma par­tida na cidade entre o clube para­naense e o Atlético Goianiense pelo Campeonato Brasileiro da Série B. Os manifestantes foram agredi­dos pelos torcedores com barras de ferro, pedras e pedaços de pau, enquanto chegavam ao novo local do acampamento que fica a 1 qui­lômetro da sede da Polícia Federal.

O psicólogo Wadson Arantes explica que fatos que envolvem a coletividade podem influenciar no comportamento individual, pois quando as pessoas estão em multidões heterogêneas, demons­tram ausência de responsabilida­de, pois têm certeza da impunida­de. Tanto mais forte e numerosa for a multidão e a noção de um poder momentâneo, por se tra­tar de um grupo com as mesmas ideias e opiniões, torna-se possí­vel, então, cometer atos que eram impossíveis caso o indivíduo esti­vesse isolado. “Em coletivo existe o agrupamento que os sujeitos acre­ditam que podem fazer o que qui­ser, pois não serão punidos, além de que, os grupos vão se articulan­do e imagina: aquele grupo não pensa igual ao meu grupo, então posso atacá-los”, explica.

ATAQUES NAS REDES SOCIAIS

As redes sociais possibilitam criar um espaço onde as pessoas se sentem livres para expor suas opiniões, visualizar somente o que desejam, além de encorajar as pes­soas a iniciar um conflito. De acor­do com o psicólogo, as pessoas que acreditam que ao realizar um ata­que por uma rede social, estão pro­tegidas, além de se sentir empo­derada para poder expor todos os seus sentimentos negativos em re­lação a um determinado assunto, principalmente sobre a atual si­tuação do Brasil, onde as pessoas criaram forças e resolveram expor suas revoltas. Para ele, assim como os grupos formados nas ruas, são também criados nas redes sociais, que da mesma forma vão criando forças e atacam os grupos opostos. “Pode-se dizer que há uma men­te coletiva, da mesma forma que o indivíduo é influenciado por um grupo, um grupo pode ser influen­ciado por um indivíduo”, finaliza.

As discussões sobre política nas redes sociais vêm causando confli­tos na vida real, abalando não só as amizades, mas também na relação familiar. Portanto, há brigas irre­conciliáveis, mesmo entre aqueles que moram na mesma casa. Por ser um local onde os usuários fazem o seu mundo, a falta de compreensão em não aceitar opiniões, houve au­mento no número de exclusões de amigos, denúncias e falta de respei­to entre internautas, o que mostra que muitas pessoas não estão pre­paradas para o debate.

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