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Vontade de matar

Um adolescente de 13 anos foi apreendido nesta quarta-feira (23/08) como suspeito de matar uma adolescente de 14, identificada como Tamires de Almeida, no Setor Jardim América, em Goiânia.  De acordo com relatos da Polícia Civil, o adolescente abordou Tamires com um golpe conhecido como “gravata”, enquanto ela ia para escola, e lhe desferiu golpes com faca.

Após deixar o corpo de Tamires na escada do prédio, onde ambos moravam, o jovem foi ao Colégio Estadual Jardim América, mostrou a faça para outros colegas e confessou o ato para diretora da instituição. Além de morarem no mesmo prédio, o suspeito e a vítima estudavam na referida unidade de ensino, mas de acordo relatos dos vizinhos eles não tinham qualquer tipo de relacionamento.

Amigos e conhecidos do adolescente contam que ele já havia dito que não gostava do jeito que Tamires andava, mas sem explicar sua motivação com maiores detalhes. Um deles, Isadora, de 15 anos, afirma que o jovem ficava na mesma roda de amigos. Num desses encontros, Isadora relata que ele comentou sobre Tamires. “Quando ela saiu da escola, passando por nós, ele falou que não aturava o modo como ela andava e hoje essa história veio à tona de novo”, afirma.

Isadora descreve o adolescente como calado, agressivo e que sempre andava com uma calopsita no ombro. “Uma vez a gente brincou na rua, ele não aceitava perder, partia pra cima dos colegas. Ele não aparentava ter medo, fazia as coisas sem pensar nas consequências”, conta.

A jovem relata ainda que amigos próximos desconfiavam de que o suspeito participasse de jogos, como o que ficou conhecido por Baleia Azul. “Ele gostava muito de jogos, tenho certeza de que ele fez isso por causa desse jogo. Não cheguei a ver a cicatriz, mas me contaram e quando eu o vi da última vez ele estava um lenço no braço”, relata.

PIRES DO RIO

Tamires veio com a mãe de Pires do Rio e moravam no Jardim América há menos de dois anos. A adolescente foi descrita pelos vizinhos como uma moça caseira e que gostava muito de ler. A mãe e amigos próximos foram ao Instituto Médico Legal (IML) na noite de quarta-feira (23/08).  Abalados com a situação, compreensivelmente não conversaram com nossa equipe de reportagem.

No final da tarde, os estudantes do Colégio Estadual Jardim América foram proibidos de saírem das dependências da instituição para que não fossem para onde estava o corpo da jovem e interferissem nas investigações da perícia.  O suspeito morava com a mãe e tinha um irmão mais velho, que foi descrito como mais agressivo que o suspeito.  À Polícia, na Central de Flagrantes, o adolescente confirmou que não conhecia a vítima e relatou que ato que cometeu foi arbitrário.  Ele teria feito uma lista com pessoas que não gostava.

Outras testemunhas que serão chamadas durante o inquérito policial relatam que o jovem teria dito que acordou na quarta-feira com vontade de matar.

Narrativas semelhantes, crimes diferentes

Beto Silva

A narrativa do assassinato de Tamires Paula de Almeida, 14, se aproxima de outros já estudados pela psiquiatria e psicologia forense. Principalmente pela forma com que o autor planejou, executou e confessou. Existe um elemento bioquímico, mas outro comportamental. O que levou o adolescente a matar alguém que tem pouco ou nenhum contato?  

O delegado Paulo Ribeiro, da Delegacia de Investigação de Homicídios (DIH), afirma que depois do delito, o adolescente suspeito da infração teria ido à escola confessar o que tinha feito como se o crime não fosse algo tão grave. E depois reagiu de forma inversa.

O assassinato da estudante do Colégio Jardim América – conforme as primeiras observações da Polícia Civil –  ocorreu sem motivação específica.  A grande questão é o fato do autor não ter renunciado ao desejo – o que guiará o processo penal daqui para frente. Ele teve a oportunidade de praticar outra conduta, mas optou pela morte.

Em entrevista ao DM, o psiquiatra Guido Palomba diz que parte considerável dos criminosos psicopatas desenvolve o distúrbio de personalidade anti-social. O transtorno foi identificado no final da década de 1960,  mas ainda hoje é investigado por conta de suas variações.  E dentre suas características existe o desrespeito pelo sentimento, desejo e direito alheio.  

Estudos americanos sugerem que 2,5% da população apresentariam tais características de forma acentuada e se enquadram nesta categorização.

Pequena parcela destes 2,5% cometem homicídios. O caso mais clássico é do motoboy Francisco de Assis Pereira, chamado de “maníaco do Parque”.  Ele tratava com indiferença o final que deu para as vítimas.

SERIAL KILLER

Suspeito de praticar dezenas de crimes em Goiânia, o serial killer Tiago Rocha disse: "Depois que eu via a vítima, ficava cego”.

Criminosos com perfil de fácil reconhecimento do crime, confissão imediata após homicídios sem motivação e homicidas sem remorso podem também ser enquadrados como doentes com distúrbios severos que necessitam de tratamento ou isolamento. O caso mais grave de desconsideração do princípio da cautela ocorreu recentemente em Goiás: o assassino do cartunista Glauco Villas Boas e de seu filho, Carlos Eduardo Nunes (o Cadu), cometeu outros dois homicídios em 2013.

A grande questão era que Cadu no mesmo ano foi diagnosticado com esquizofrenia e se revelava incapaz de assumir responsabilidades penais por qualquer dos seus atos.

PAILI

Cadu foi então inscrito no Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator (Paili), onde receberia tratamento em uma clínica psiquiátrica de Goiânia.

Enquadrado em uma situação de inimputabilidade, já que era incapaz de perceber a gravidade de seu comportamento, ele acabou colocado em liberdade.  A passagem da internação para o ambulatório causou mais crimes.

A Justiça de Goiás, a partir de uma decisão da juíza Telma Aparecida Alves, da 4ª Vara de Execuções Penais, decidiu colocá-lo na rua. Foi ali que ele praticou mais duas mortes. Preso indevidamente (já que deveria estar sob medida de segurança), foi levado para o presídio. E lá acabou assassinado ao entrar em choque com um preso.  Morreu como vítima, assim como toda a ciranda de mortes que teve início por suas mãos.

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