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A discussão sobre a legalização da prostituição no Brasil

Texto: Mariana Larcerda

No Brasil a cafetinagem é considerada crime, mas a prostituição não. Em 2003, o ex-deputado federal pelo RJ, Fernando Gabeira (PV), apresentou o PL (Projeto de Lei) 98/2003, que visava regulamentar a prostituição, mas acabou sendo arquivado. O ex-deputado Jean Wyllys (PSOL), apresentou em 2012 o Projeto de Lei 4211/12, conhecido também como PL Gabriela Leite, que tem a mesma finalidade do que foi apresentado por Gabeira.

O nome pelo qual ficou conhecido o projeto de lei é uma homenagem a Gabriela Leite, prostituta que militava pela liberdade de escolha da profissão. Ela deixou a faculdade de Ciências Sociais na USP nos anos 70 para se tornar prostituta, boa parte da sua atuação como ativista ocorreu durante a ditadura militar.

No PL de Jean as casas de prostituição são permitidas, desde que não haja prática de exploração sexual. O parágrafo único do artigo 2º do PL 4211/12 define como exploração sexual a apropriação total ou maior que 50% do rendimento obtido pela prostituta, o não pagamento pelo serviço contratado e a obrigação da prática da prostituição de forma violenta.

A fundadora da ONG Mulheres da Luz, Cleone dos Santos, que já esteve em situação de prostituição e hoje por meio da instituição presta auxilio a garotas de programa, diz que a definição de exploração sexual de Jean Wyllys está equivocada: “Qual trabalhador aceita trabalhar pra que o patrão fique com 50% do que ele ganha? A gente não pode ser conivente com uma exploração dessa’’.

A ONG fundada por Cleone dos Santos e pela missionária Regina Coradin, é uma iniciativa autônoma para prestar apoio à pessoas em situação de prostituição e fica localizada em São Paulo, dentro do Parque da Luz. A maioria das moças atendidas pela Mulheres da Luz tem cerca de 40 anos, idade em que a demanda de programas cai e as boates de regiões mais valorizadas não as aceitam mais. Por mês, Cleone, Regina e os demais voluntários da ONG atendem cerca de 500 mulheres, oferecendo auxílio psicológico, cursos de alfabetização, espaço para leitura, rodas de conversa sobre direitos básicos e entre outros serviços.

Para a fundadora da ONG, se essas mulheres tivessem acesso à educação e qualificação profissional, visto que boa parte não chegou a ser alfabetizada, a prostituição não seria a única alternativa de renda. Para Cleone, a regulamentação pode tornar as prostitutas “reféns’’ de donos de casas de prostituição: ‘’Sem estar regulamentado os donos já têm segurança pra controlar as meninas, agora imagine uma coisa regulamentada. […] Quanto mais dinheiro eles ganharem em cima das mulheres, melhor pra eles’’, afirma.

Cleone dos Santos e Regina Coradin, fundadoras da ONG Mulheres da Luz. Foto: Reprodução/Facebook

Transexuais e travestis também estão entre as pessoas atendidas pela ONG Mulheres da Luz. Segundo a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), 90% da população trans tem a prostituição como fonte de renda. Isso ocorre porque as pessoas desse grupo social têm seus direitos básicos negados já na adolescência. Em outra pesquisa, a associação estimou que 13 anos é a idade média em que jovens transexuais são expulsos de casa.

A organização AfroReggae promove o Projeto Além do Arco Íris, que busca auxiliar travestis e transexuais. Em uma pesquisa realizada com participantes do programa, foi constatado que apenas 45% possuem o ensino médio completo. Em Janeiro de 2015 foi lançado o Programa TransCidadania, do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT).

O projeto oferece um auxílio mensal de R$1.047,90 aos participantes do programa, que cumprem semanalmente uma carga horária de 30 horas de estudos escolares, cursos de capacitação profissional e noções sobre direitos humanos e cidadania. Ao receberem o auxílio, transexuais e travestis encontram outras opções de renda e trabalho fora da prostituição. Atualmente, 190 pessoas são beneficiadas pelo projeto.

A prostituição ao longo da história do Brasil

Segundo a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), até o ano da abolição da escravidão no Brasil, em 1888, a maioria das mulheres prostituídas eram escravas negras. A partir do século 19 também era comum ver mulheres migrantes em situação de prostituição, como francesas, italianas, espanholas e judias. Elas buscavam escapar dos conflitos e guerras que assolavam seus países de origem, e em especial as mulheres judias tentavam se desvencilhar do forte antissemitismo que tomava conta da Europa.

Na década de 80, a opinião publica foi responsável por ligar diretamente homossexuais, prostitutas e usuários de drogas injetáveis a propagação de DSTs e AIDS. Em 1988 foi criado o PREVINA, projeto que tinha como finalidade realizar atividades para a prevenção de DSTs com grupos específicos, entre eles, as mulheres em situação de prostituição.

Em 2002, a categoria ‘’profissionais do sexo’’ foi incluída na Classificação Brasileira de Ocupações do Ministério do Trabalho e Emprego, o que tornou possível que pessoas em situação de prostituição pudessem ser registradas como profissionais autônomos na Previdência Social.

O que dizem os dados sobre exploração e tráfico sexual

Até o final de 2016, o canal Ligue 180 registrou um total de 488 denúncias de tráfico sexual em que 317 das vítimas são mulheres. É o que aponta o
Relatório Nacional Sobre Tráfico de Pessoas, do Ministério da Justiça. Das 488 denúncias, 189 dos casos são para tráfico internacional e 299 para tráfico interno.

Os estados de Minas Gerais e São Paulo são os que mais registraram processos criminais por tráfico de pessoas com a finalidade de exploração sexual até 2016. O número de presos por tráfico internacional de pessoas com fins de exploração sexual até 2014 é de 230 homens e apenas 6 mulheres.

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